quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

O SILÊNCIO DA JULIETA DE PEDRO ALMÓVAR.



O silêncio pode ser definido como ausência de ruídos. Contudo, não pode ser considerado como uma falta de atuação. Silenciar-se ou quietar-se não deixa de ser parte de um ato. Ou seja, também não faz jus a uma ação? Talvez vislumbrando os meandros dessa questão tão contraditória, o diretor Pedro Almodóvar tenha escolhido este tema para movimentar os 90 minutos da película Julieta (2016).


A história se desenrola nas questões que envolvem a falta de diálogo e omissão de segredos. Sem dúvidas, silêncio seria um nome que denominaria bem o filme. Mas o o substantivo foi substituído pelo nome próprio da personagem principal. 

O melodrama é baseado na livre adaptação de contos da escritora canadense Alice Munro (Prêmio Nobel de Literatura em 2013). Assim, somos guiados por uma narrativa mais contida e sem as piadas sarcásticas tão comuns nos filmes de Almodóvar. Das características do consagrado diretor podemos destacar a trama psicológica e mulheres a beira de ataques de nervos.



A Julieta espanhola é uma mulher de meia idade cheia de segredos. Ela passa a vida silenciando, renegando e fugindo do passado. Inicialmente, planeja deixar a Espanha com esperança de esquecer tudo. Contudo, muda de plano após reencontrar uma conhecida na rua. Então, decide escrever uma carta reveladora à filha Antía.

O passado acaba sendo resgatado em espécie de flashs. Somos guiados a uma viagem de trem na qual a jovem personagem foge de um estranho que queria conversar. Por fim, acaba conhecendo o atraente pescador Xoan. Ambos acabam se envolvendo intimamente mesmo ele tendo uma esposa em coma.


Julieta fica grávida e resolve ir atrás de Xoan após receber uma carta dele.  Acaba chegando justo no dia em que a esposa é enterrada. Os dois estão livres para ficarem juntos. Mas os felizes para sempre dura menos que o esperado. O passar dos anos cobra juros de cada palavra silenciada.

A descoberta de um segredo do marido provoca uma briga entre o casal. O pescador busca refúgio no mar revolto. Assim, Julieta fica viúva e se sente culpada por tudo. O silêncio e remorso faz ela se tornar fraca e depressiva. A filha adolescente acaba cuidando da mãe. Mas a menina também acaba acumulando segredos e foge de casa sem explicação plausível. As circunstancias relatadas na carta justificam os tormentos da personagem madura.



Como já relatado, a ausência de palavras e diálogos entre os personagens significa muito para o desenrolar e desfecho da trama. Somos envolvidos pelos sentimentos e ações contraditórias de uma personalidade tão comum nos dias atuais. Acabamos nos identificando. Até mesmo porque muitas vezes silenciamos e calamos coisas por medo, vergonha ou conveniência. 

Quem nunca se calou?  Quem pode bater no peito e afirmar que é um livro aberto pronto para ser lido? Será que realmente nunca rasurou ou arrancou alguma página para esconder algo?

Confesse ou negue cada um sabe da própria verdade. O filme mostra a personagem tentando aparar a arestas que lhe fez seguir por caminhos adversos.  Por isso, numa espécie de catarse, acabamos torcendo para Julieta reencontrar a filha e acertar as diferenças num demorado diálogo entre mãe e filha. Será que este será o desfecho?


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